sábado, 30 de novembro de 2024


 

encontros

gosto de acreditar que as pessoas pelas quais cruzamos em nossos caminhos não foram
inventadas pelo simples e puro deleite do acaso.

nesse caso, talvez, queira apenas justificar meu arrebatado romantismo drummoniano – amor
incontestável pelo próprio amor. mas realmente dispenso o acaso – dispenso os bons modos, dispenso a etiqueta.

apenas penso. apenas sou.

gosto também de acreditar que encontros não possuem receita:

INGREDIENTES:

2 pessoas: 20 se for muito sociável e um tanto quanto livre de grilhões.

1 ambiente agradável: não se espante ao descobrir que tal ambiente venha a ser uma esquina qualquer.

amor: só use se realmente acreditar nele. caso contrário tente um pouco de bom sexo. funciona? não sei. espero que sim.

MODO DE PREPARO:
Una todos os ingredientes e espere pelo resultado. algumas pessoas esquecem o que estavam a preparar; outras oram a deus ou ao diabo pelo sucesso de sua receita. dê preferência ao meio termo. ou ao amor*, caso o tenha utilizado.

BOM APETITE !!!

*só para relembrar: amor é aquele ingrediente que só funciona se você crê nele. se optou pelo sexo, ou pelos dois, espero que tenha usado proteção.

gosto de acreditar que os encontros são gerados pelo antagonismo magnético. 
não pergunte-me o que é. acho que nem eu mesmo o saberia. e nem o quero. 

aqui o penso. aqui o sou .

todos esses desejos encontram-se no infinito. 

ao menos aqui nesse universo todo e só meu.

gosto de acreditar que os encontros são atemporais. 

ao menos os bons encontros. nosso encontro.
gosto de acreditar que meu bom-encontro está por vir.

encontre-se.

encontro-me.

encontremo-nos.

sexta-feira, 29 de novembro de 2024



ao meu redor


ao meu redor sinto e vejo,
a primavera a insinuar lírios.
ao meu redor desejo e vejo,
o outono a insinuar arrepios.

ao meu redor entendo e vejo,
o verão a insinuar gracejos.
ao meu redor deito-me e vejo,
o inverno a insinuar bordejos.

ao meu redor paro e vejo,
você a insinuar olhares.
ao meu redor desesperadamente vejo,
o mundo a roubar sonhares.



desabafo ao tempo



o conturbado e contraditório conceito temporal é fascinante. existe por si mesmo e não precisa de observadores para ser comprovado.

as rugas, a ferrugem, o crescimento e desaparecimento das plantas, o nascer e pôr do sol são testemunhas que o tique-taque  está exercendo sua função primordial: definhar o que existe e levá-los ao seu fim inevitável.

a platéia do senhor das catedrais vive a mudar, pois diferentemente dele - o nobre - deixaremos aos túneis passados a consciência do todo, inclusive a dele.

não romantizemos sua importância. ele permite o nascimento para regozijar-se na morte . sim, ao contrário do que dizem, penso que sim, deus joga dados.

nosso meio é teatro e nós, marionetes de um bando de eternos fanfarrões e suas incontroláveis gargalhadas provindas de nossos pecados, nossos erros, nossas gafes e nossas ridicularidades.

pois lhe digo tempo: talvez sua platéia seja insustentável em algum momento de seu libertino caminho. tome pois cuidado: limpe suas marionetes com cuidado - não deixe a poeira incrustar,  pois um dia não poderá mais comprar novos bonecos de pano.

e ao estar só, caro tempo, verá que sua eternidade é inútil e descobrirá que é escravo de si mesmo.

terça-feira, 26 de novembro de 2024

 mi


na beira-mar com sua palmeira,
desenhando traços na areia,
observa o sol iluminar,
uma vida cheia de pesar.

sonhos escondidos no peito,
ali realizam-se com deleito,
deleito de princesa,
com olhos de grandeza.

em Mi é meu poema,
e encontra-se jurema,
encontra-se acalanto,
encontra-se recanto.

(para minha amada mãe)

domingo, 24 de novembro de 2024



jeito

toco a janela,
a cortina,
a colina,
a vela.

deleito-me na dor,
na textura, 
na amargura,
no compor.

observo o caminhar,
o pouso,
o repouso,
o velar.
folhas

ao céu de outono,
se despedem folhas douradas
pelo vento gentilmente tocadas,
voaram e amaram sem retorno.

e em seus jardins rosas apanharam,
e perfume eterno deixaram,
aos corações dos quais amaram,
e em suas almas permaneceram.

e poemas recitaram,
com rimas de sonho e fantasia,
ao nascer de cada dia,
florescendo a melodia.
escrivaninha

escrivaninha de madeira antiga,
cadeira de histórias contadas,
grafite que traça sonhos,
poeira que cobre a saudade.

papel amarelado, poema esquecido,
grafemas que dançam ao vento,
cordel de lágrimas e emoção,
devoção e lástima, um canto.
se

se lhe ouço,
anseio.
se lhe digo,
gorjeio.


se lhe toco,
sacio.
se lhe cheiro,
arrepio.

se lhe devoro,
vadio.
se lhe perco,
vazio.

sábado, 23 de novembro de 2024

 
liberdade: a arte de escolher a escravidão mais conveniente

a liberdade é ilusória. 

escolhas? - escolhidas a dedo para serem postas à nossa disposição.

a liberdade é uma doença autoimune. nada além disso.

 procrastinação

procrastino tudo: menos o procrastinar.

irônico

nada mais irônico do que quando o sarcasmo é apenas uma brincadeira.

 o vazio é o berço do todo

assim como um quadro em branco à procura de cores, a inexistência clama pela existência, tal qual o campo, a verdecência.

 a verdade é um horizonte que recua

a verdade sendo desvendada pela própria verdade, que por sua vez, é velada pelo rio do passado.

se a verdade é verdadeira, clamo pelo meu quinhão de mentiras prazerosas.

diálogos do silêncio


entre linhas
entre notas
entre dedos
entre vinhas

entre suspiros 
entre corpos
entre toques
entre respiros 

entre amores
entre dias
entre noites
entre louvores

entre juazeiros
entre pessoas 
entre almas
entre pinheiros

silêncio

sexta-feira, 22 de novembro de 2024


não
não peço compreensão 
ouça-me
não peço elogios
veja-me

não peço ouro
doure-se
não peço viagens
invada-me

não peço canções 
declare-se
não peço esculturas 
mostre-se

não peço promessas
expresse-se
não peço santidade
prove-me

não, peço...

cante 


declame, clame, recite, encante,
à música, à musa, à mesa, ao chão.
dedos, lábios, pés, mãos,
cante, cante ao refrão.

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

interesse-se
interesse-se
por uma fagulha,
por uma planta,
por uma anta.

interesse-se
por um livro,
por um feito,
por um defeito.

interesse-se
por uma conversa, 
por uma paisagem
por uma viagem. 

interesse-se pelo interesse que seja,
mas viva e, por favor, interesse-se por algo!

poetas sim, poetas não


o poeta não explica
o poeta não contabiliza
o poeta não gramatiza
o poeta não disseca

o poeta sente
o poeta mente
o poeta respira
o poeta escancara

escancara amor
escancara dor
escancara temor
escancara escândalos

escandaliza aromas
escandaliza toques
escandaliza sabores
escandaliza sons

o poeta poetiza

 incertezas

a incerteza sempre existirá, mas duvide desta minha declaração.

comunicação

1) intenção (o que eu quero falar)
2) expressão (o que eu de fato falo)
3) objetivo (o que quero que seja entendido)
4) recepção (o que de fato foi entendido)

comunique-se. parece simples não?

quarta-feira, 20 de novembro de 2024

caixa de fósforos

quarenta eles são,
no gingado das calejadas mãos,
em comunhão com com o sambista,
e atentos ao repentista.

um uníssono perfeito,
cantando a despeito,
do surdo ou violão,
importando-se sim com o balançar da multidão.

ao fósforo não interessa estar sozinho,
remexe junto a todos com carinho,
estridentes, berram aos céus,
são ousados, não precisam de véus.

triângulo, surdo, pandeiro, 
reco-reco: instrumento arteiro,
mas que ao som dos quarenta,
reverência apresenta.

em rítmo de boa praça,
os fósforos cheios de graça,
contagiam os que, ao ver,
pedem ao samba para nunca morrer. 


crisálida


na crisálida da alma,
uma borboleta se forma,
renascendo das cinzas,
uma nova luz se transforma.

a mutação,
vem do chão,
vem do ar,
vem de tudo, até do andar.

ela vem do desapegar,
vem do abraçar,
vem do envolver-se,
vem do convencer-se.

vem da luta,
da permuta,
do necessitar,
do almejar.

ver o porquê,
pra que?

transforme-se

 
dissonante

do incômodo da tensão,
à ânsia do repouso
do desprazer da falta de sofisticação,
à paz da autenticidade.

do vôo entre as galáxias,
à dança das mãos com uma caneta azul
do mais sofisticado cardápio,
à um pedaço de pão.

das canções mais intrigantes,
às rodas de ninar
dos diplomas mais irrealizáveis,
à doçura do ABC.

de vincent,
à adoniran
da odisséia em 2001,
ao distópico 1984.

dissoe






terça-feira, 19 de novembro de 2024

sombras

dentro de cada ser humano, há uma vasta extensão de luz e escuridão, um cenário intricado onde as sombras desempenham um papel tão crucial quanto o brilho da luz. essas sombras, longe de serem meros defeitos ou falhas, são reflexos profundos de nossa psique, fragmentos que, embora frequentemente prefiramos ignorar, moldam nossa identidade e nossa experiência de vida.

as sombras são as partes ocultas de nosso ser, aquelas que muitas vezes tememos explorar ou aceitar. podem ser medos reprimidos, desejos não expressados ou traumas não resolvidos. em muitos casos, essas sombras surgem de experiências passadas, de feridas emocionais que tentamos enterrar sob camadas de indiferença ou distração. no entanto, ao fazer isso, não eliminamos sua influência; simplesmente damos a elas um espaço mais sombrio e menos visível para crescer.

reconhecer e aceitar nossas sombras não é uma tarefa fácil. em uma cultura que frequentemente glorifica a perfeição e a visibilidade, enfrentar nossas imperfeições pode ser uma experiência desconfortável e desafiadora. No entanto, é nesse ato de coragem, ao permitir-nos ver e aceitar nossas sombras, que encontramos uma verdadeira oportunidade para o crescimento pessoal.

frequentemente, é através das sombras que encontramos nossa maior força. ao integrar nossas partes mais escuras em nossa identidade consciente, aprendemos a ser mais empáticos, mais resilientes e, em última análise, mais humanos. as sombras, embora desafiadoras, oferecem uma perspectiva única sobre nossa essência, lembrando-nos de que a luz e a escuridão não são opostos, mas duas faces de uma mesma moeda.

reflexo à beira do rio

Aqui onde moro, caminhadas invariavelmente levam à beira de algum rio. Um privilégio que aos poucos são mais raros, haja vista que a sede contemporânea pelo urgente deixa-nos imersos em um universo de cegueira cotidiana.

Porém, em uma destas caminhadas, encontrei-me com um velho conhecido. Quando criança costumava chamá-lo de Destino. É Destino. Achava de forma inconsciente um belo nome para um rio, pois sabia onde ele estava, mas não fazia a mínima ideia de para onde destinava-se o tal Destino.

Diziam as sábias vozes dos experientes adultos: "seu rumo é em direção ao mar".

Ao mar? Mas o rio é doce! Ele vira mar? Morre então? Mas...mas...ele quer transformar-se em mar?

Pobre Destino, talvez nem ele soubesse. Destino quer, ou é obrigado a ser algo que nem sabe o que?. Que aburdo!

Talvez ele não tenha escolha. Talvez Destino nem escolhera ser rio. Talvez pedira para ser mar, árvore, pedra, urso, vespa, gente - é...gente não - duvido que Destino pedisse por um destino tão cruel.

Olho para ele atentamente, mas não o reconheço. Em nosso último encontro ele parecia diferente. Mais alegre, mais potente, mais empenhado em vencer as curvas que o solo lhe impunha.

Hoje o observo mais cabisbaixo, mais temeroso, ouso a dizer, mais acanhado.

Talvez todo o lixo que ele transportara até aqui, o esteja impedindo de prosseguir em sua brava jornada até o tal de mar. Mas, quem o poluíra tanto, e como Destino permitiu que algo que não fosse de sua natureza, trancafiasse sua essência?

Destino talvez tivesse entregado-se ao destino. Mas então Destino também teria um destino? Qual o destino de Destino?

Não sei responder, mas ao observar meu reflexo em outrara magnífico rio, noto que eu também havia sido como ele: vibrante, obstinado, valente ansiando para ser um mar. 

Hoje sou rio? Sou mar?

Sou valente? Impotente?

Obstinado? Conformado?

Bravo? Covarde?

Eu nado ou nada?

Talvez mares já não despertem mais minha curiosidade. Afinal de contas o que é ela, a curiosidade, senão a ânsia em descobrir o que não se sabe?

Eu nada. Não nado.

Coloco meus pés à beira de Destino. Ele transforma-se como se houvesse ainda um quinhão de esperança em sua reunião de infinitas gotas gélidas.

Meu corpo reage, como na tentativa de dizer: "Sim, eu ainda nado".

Mas(mais?)nada.

 





ode ao funeral

vou partir, mas não antes de confessar: fui ridículo, absurdo, absurdo. e é isso que torna-me humano. 

nesta vida, erramos, tropeçamos e caímos.
não tenha medo de ser ridículo, pois é lá que está a liberdade.

o que é ser ridículo? é ser banhado por sangue e sustentado por ossos, é ser humano com todas suas contradições. é ser vulnerável, exposto e autêntico.

adeus, ridículo. 
adeus, vergonha. 
adeus, medo.

bem-vinda, liberdade. 
bem-vindo, você.

eli

libertei-me,
li.
escrevi,
vi.
ruptura

observamos o belo pássaro chegando ao seu ninho, o delicado movimento de uma mulher ao passar as mãos leve e livremente em seus cabelos. 

observamos a reação de um abraço carinhoso em um amigo, o sorriso de uma criança ao ganhar um elogio.

observamos o belo nascer do sol em uma manhã de outono e somos invadidos pela sua explendorosa partida no dia em que deitara-se ao horizonte preparando-se para hoje. observamos um objeto fora de seu costumeiro lugar (não aprisionem seus objetos) e damo-nos conta de sua beleza outrora não revelada.

observamos casais apaixonados de mãos dadas caminhando no parque. observamos as folhas secas nas quais eles pisam, mas sem deixarem de olhar para cima, certificando-se de seu lar.
 
observamos a beleza de nossos pés, que areias brancas e mares esverdeados tiveram a chance de visitar. observamos os fios brancos em nossos cabelos que, resistentes aos inúmeros cortes, foram insistentes em sua jornada de permanência.

observamos sem expectativas. observamos a curiosidade por ela mesma.

vigiamos apenas uma coisa: o medo. (observem)

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

encanador


o aroma do metal e da madeira são inubriantes 
quem dera-me sentir isso como antes
o gélido toque dos trilhos do trem
vem e vem e vem e vem
trem e trem e trem e trem

seu galope inconfundível trouxe-me ao incorrigível 
o amor ao movimento e a notória glória trouxe para mim uma cidade de vitória 
cá estás ou cá estou? Não sei. Mas de seus braços nunca me distancirei

aqui estive sentindo o cheiro dos trens em meu avô.
elpídio: trabalhador, bêbado e mal entendido - cá estou. 
eu ao menos meu avô, sem nenhuma vergonha, seu safado encanador, enganador sou.
savana

os ventos da savana  vem a mim como um implorar sem temor e sem orgulho.

chegam de repente como um vulto e marcam sua chegada como um rugido ou uivo.

os sons chegam a mim clamando por reflexão, e neste momento descubro que não estava na savana, mas ela em mim.

e no meio dela encontro-me diante de um rio, ao qual vejo meu reflexo e quando percebo pulo na água, não como Narciso, não por vaidade, mas para submergir em meu ser e tentar me entender.

mas porém, como diz o poeta, "narciso acha feio tudo o que não é espelho." todavia não naquele momento. lá descobri-me de meus véus e máscaras e fui apenas...

eu.

deaazê

A tristeza incendeia

B ela a brincar com nossa imaginação 

C ovardemente também vicia

D ando vazão a sentimentos sem sentido

E em sua voracidade 

F orja em nossas almas o

G élido sentimento de solidão

H erculeamente luto, maldita tristeza

I gnoro sua sedução 

J á que usa-me de brinquedo

K afkaniano serei, transformar-me-ei

L amurio pois de sua fanfarronice 

M inha dor não é de zanga, mas fleuma

N ão traga-me seus sedutores véus 

O s que aceitei avoaram-se ao léu 

P ois siga seu destino, tristeza

Q uiçá para longe de meu ser

R oedora de minhas vísceras foi

S olícita e airosa como uma amiga

T odavia perigosa

U ma,  única e venenosa 

V á de retro serpente

W alter em suas belas composições 

X ícaras de chá sejam servidas

Y in-yang entre nós já não existe mais

Z ombo finalmente por você ser incapaz




éfe

no eco suave das guitarras
vibra a melodia dos sonhos,
onde vozes se entrelaçam
como versos antigos,
desvendando segredos
de terras distantes.

ali, os poemas fluem como rios,
serenando corações aflitos,
nutrindo as raízes do ser
com a sabedoria do vento.

nos olhos da alma,
reflete-se o horizonte,
onde as estrelas dançam
ao som de uma canção
que só os puros podem ouvir.

éfe, o nome sussurrado no silêncio,
é a bússola que guia
pelas trilhas da memória,
onde o passado e o futuro
se encontram em um abraço eterno.

nas cordas da guitarra,
reside o pulsar da vida,
e cada nota toca fundo,
despertando a essência
que repousa nas profundezas do ser.

éfe, onde a poesia se torna palpável,
onde as palavras são lâminas
que cortam o véu da realidade,
revelando a verdade pura
oculta em cada batida,
em cada olhar,
em cada respiro de eternidade.

longe de casa

a leveza do ar contrastava com a intensidade da luz deste dia. a caminhar estava -  chutando latinhas na rua. O som do metal refletia como um alerta a meus ouvidos: “acorde”. 

naquele momento era apenas uma pessoa longe de casa. longe de mim. fugindo.

observava imperfeições  em tudo. esta visão trazia um espelho à minha frente. mais latinhas surgiam e eu as chutava. as chutava e seu som metálico enlouquecia-me. por que arde tanto? por que fere-me tanto?

eu era apenas uma pessoa longe de casa. não conseguia entender.

desisti então de chutá-las. catei-as pois. observei-as. senti o frio metal em minhas mãos. o calor do sol as aqueceu...sim, não posso chutar as latinhas pois preciso colhê-las. 

eu era apenas uma pessoa longe de casa. começando a entender.

observá-las de perto...ahhhhhh….que horror!!! a complexidade de perceber que minhas latinhas amassadas nunca mais voltariam ao que um dia foram deixou-me devastada.

mas eu era apenas uma pessoa longe de casa. e queria entender.

cansada, sento-me. eu era apenas uma pessoa longe de casa. aprendendo a entender.

avisto em meu horizonte uma bela construção. imperfeita. 

Pessoas sorrindo dentro dela. Cantando ao dançar. Percebo em sua imperfeição a perfeição. 

sorrio. entendo. 

fui apenas uma pessoa longe de casa. 

e agora entendo.

navegar

outrora dito foi-me que os ventos deveriam guiar-me, não ancorar-me ao mar. a prisão orar.

dela desfiz-me, e ao vento naveguei, sem a menor intenção de obedecer. 

eis que sua bravura e sua angústia levam-me a perguntar: Onde estou?
e ainda a indagar, onde vou?

por agora devo contentar-me com os ensinamentos passados pelos ventos? ora agitado, ora calmo, encontro-me a pensar e a navegar,
sentindo a brisa que bate em meu peito e o balanço do mar.

uma tempestade chegou a resvalar,
a água salgada em sua agitação veio a me atingir.

uma ferida que tinha ardeu e pus-me a refletir.

por quê? não deveria também o mar guiar-me?

entendi pois que o vento sem propósito, propósito não possui. quem a tudo está disposto, disposto a nada está. mas havia um horizonte diante da tempestade. 

sempre há um guia quando abrimos nossos olhos e fugimos de nosso egocêntrico eu.

guia-me. guia-me. 

mas quem? 

venha aqui

em meus primeiros suspiros ouvi estas palavras. Saindo do ventre de minha mãe foi-me dito. “venha aqui”. 

isto por si só corrompia-me. eu não queria ir lá. consciente do que estaria por acontecer, apenas gostaria de estar em meu próprio caminho. possuía um nome não escolhido por mim, possuía uma família não escolhida por mim e perspectivas e expectativas que nunca foram as minhas.

a trilha e as procuras foram intensas desde o início, mas havia grilhões que não consegui vencer. fazer aquilo que desejei sempre foi sufocado por aquilo que desejaram de mim. e assim o fiz, assim optei.

uma opção mais que tola e incoerente. “venha aqui”

poderia ter tido o reverso. Eu gosto de matas virgens e seria  nelas que me encontraria. eu gosto do novo e não no que há tempos faz sentido. demorei muito...e as matas foram (talvez) extintas.

“venha aqui” aprenda isso, aprenda aquilo! não ... .eu não quero aprender nada pronto. eu quero desbravar. 

não mande-me para onde queres que eu vá, pois não irei. quero ser dono do meu próprio destino, certo ou errado quero ter este direito. danem-se vocês príncipes da vida. almejo ser o bufão que a todos faz rir enquanto as lágrimas não consegue conter. 

“venha aqui”.

e acorrentado às decisões alheias, o pranto chegou, porém ele possuía uma cura. 

o amargo gosto da fuga aproximou-se e transformou-se em amigo. a realidade transformou-se em um mundo de faz de contas e o universo foi amenizado com uma errônea forma de felicidade.

“venha aqui”  

e desta vez quem disse-me isso foi o delírio da surrealidade e eu o abracei.

troquei um grilhão pelo outro.

“venha aqui”

não irei.



discreto
 
sou brisa,
sou tempestade,
sou pluma,
sou rochedo.
 
infinito sou,
mas átomo também, 
gênio sou, 
mas estúpido também. 

sou gentil,
sou rude,
sou tudo,
sou nada.

a minha discrição deixo aos olhos sagazes e loucamente curiosos,

a minha obviedade deixo de brinde a estupidez dos idiotas.
 


 porta

porta
parta-se
prontifique-se
posicione-se

porta

poetize-se
predomine-se
prorrogue-se
prolongue-se

mas

porta

abra-se

palavra
palavra dita
bendita
maldita

palavra

palavra cantada
orada
chorada
escrita

palavra inventada
palavra de pranto
encanto
palavra



domingo, 17 de novembro de 2024

fuga
farto estou da realidade
quem dera-me uma mentira bem elaborada
a qual muta-se em verdade
e precisa ser eliminada